O lugar onde se mora é também o lugar onde se guardam os afetos, os dias e noites vividos e onde a memória afetiva tece a história. É disso que falam os projetos de alguns ambientes na edição 2018 da CASACOR Pernambuco. Aproveitando a história rica de vida e detalhes que remetem a muito afeto e ao cotidiano familiar, arquitetos se inspiraram e transformaram os espaços vazios em lugares de muito bom gosto, conforto e aconchego.
Eveline Carvalho e Graciely Nery (da ArquiteturaASSIM) uniram afeto, romantismo, integração com a natureza e inovação tecnológica e criaram uma receita lúdica para o lugar dos sonhos de uma criança. Os elementos se encontram no Quarto da Menina, para contar um pouco da história do quarto de uma menina “sapeca e romântica, que no passado ocupou aquele espaço”.
A inspiração nos hábitos da pequena moradora, que brincava no jardim emoldurado pelas janelas do seu quarto, está por todo ambiente, cheio de encantamento. As cortinas criadas exclusivamente para a mostra foram desenhadas por ela, Mariana Melo, que hoje é designer e trabalha com estamparia de tecidos.
No espaço há um tablado, medindo 2m x 2,80cm, onde estão a cama e um sonho materializado da criança que dormia ali: uma cabana com brinquedos, reproduzidos em artesanato, a partir das lembranças dos brinquedos que ela gostava. Além deles, também compõem o ambiente um tapete e almofadas coloridas de crochê, em tons suaves e cinza, rosa chá e lilás, que harmonizam com as cores do lugar. Um carneirinho de madeira e lã, em tamanho natural chama a atenção de quem visita o local.
Com duas grandes janelas que se abrem para o jardim, o ambiente garante luz natural e integração com o verde, trazendo para o projeto o conceito da edição, a Casa Viva. Outro destaque é um painel de MDF vazado, em formato de pétalas, flores e borboletas. Um importante detalhe criativo é a ´pintura com efeitos cromáticos em ombrè, um degradè inspirado nas cores do por-do-sol. A iluminação pontuada e cênica complementa o cenário, que ainda oferece um camarim para as crianças.
Memória afetiva que inspira
A memória afetiva é também a inspiração da arquiteta Ana Cristina Cunha para sua Sala de Leitura. A principal ideia é preservar a arquitetura original do espaço de 28 m² acrescentando itens antigos à decoração e mobiliário moderno com elementos para homenagear a antiga moradora do casarão da Família Santos. Rosália Santos, que morou na casa por mais de 40 anos foi cliente de Ana Cristina.
“Criamos um ambiente aconchegante, contemporâneo preservando a identidade da casa e a função do espaço, que é o relaxamento, a convivência com a família, com os amigos”, comenta a arquiteta. “O projeto leva o visitante a refletir sobre conexão entre o passado e o presente valorizando as memórias afetivas”, explica.
A integração entre o interior e o exterior aparece nos grandes vãos das janelas que foram preservados permitindo a entrada de luz e do verde. O projeto mantém o piso em assoalho de madeira e o teto original do casarão. A sala de leitura investe em mobiliário assinado por grandes nomes do design nacional, como Jader Almeida, Guilherme Torres, e peças icônicas de Sérgio Rodrigues – como a Poltrona Mole e a Cadeira Menna.
O espaço ainda conta com peças do mobiliário e decoração que pertenceram a Rosália Santos, como alguns de seus livros raríssimos. Esses objetos foram colocados em um móvel desenhado pela própria Ana Cristina e executado pela Bontempo. O paisagismo do espaço foi feito por Ana Lúcia Nunes.
O Quarto do Casal traz um detalhe especial que também tem inspiração na memória afetiva: a cama de latão, herança da família Santos. O espaço foi idealizado pela arquiteta Andréa Calábria para um casal moderno, que aprecia design, moda e arte. O conceito é de um refúgio acolhedor, que conte histórias e inspire sonhos.
O mobiliário harmoniza o passado e o presente. Peças de Sérgio Rodrigues e Jader Almeida estão em sintonia com a cama. O forro do teto foi preservado, em referência às belezas de época. A paleta suave, entre o bege e o branco, é aquecida pela madeira e requintada com elementos dourados.
Na Sala de Estar, de Zezinho e Turíbio Santos, o respeito ao imóvel e à história da família regem o projeto. Segundo Zezinho, a ideia é oferecer um espaço para convívio, um cantinho de conversa, onde as pessoas possam desfrutar de música e do verde que cerca o casarão. Ressaltando que o prédio foi construído pela família do seu avô. Segundo ele, a casa de sítio foi comprada na década de 30 e o novo edifício foi projetado pelo arquiteto Aldiphas de Barros, para o novo dono. “É um lugar cheio de memórias, objetos que trazem afetividade, como o sofá onde o meu pai nasceu, a cadeira de madeira no canto da sala, a escultura de índio. Tudo é um resgate ao que foi vivido aqui”, conta.
No teto, mais um detalhe da memória afetiva: o papel de parede traz a lembrança da avó e das tias do arquiteto. São estampas florais, que levam aos vestidos das senhoras. “É impressionante, mas elas nunca vestiram nada que não tivesse flores. Era uma marca das três. Então, quisemos homenageá-las”, diz.
Nas paredes, mais referências familiares: as fotografias de Ana Cecília Santos Leal, irmã de Zezinho. No canto esquerdo, o piano da família. Fotos antigas de antepassados e parentes próximos também estão por toda a parte. “Pensamos assim: e se essa casa fosse habitada? Como seria? Seria assim. O antigo e o novo em harmonia”, conclui Turíbio.